quinta-feira, 4 de novembro de 2010

O PODER DAS ESTATINAS NO SISTEMA DE COAGULAÇÃO – É UM BENEFÍCIO TERAPÊUTICO?


Os inibidores da 3-hidroxi-3-metilglutaril coenzima A redutase (iHMG-CoA redutase) – as estatinas – têm mostrado efeito protetor vascular, como preventivo de formação de placa aterosclerótica e como consequência, preventivo de doença das artérias coronárias (LaROSA et al. 1999; LAW et al. 2003). Este mecanismo regulatório envolve a HMG-CoA e sua enzima inibitória – HMG-CoA redutase – tem o objetivo de, a partir do acetil CoA e do aceto acetil CoA, que são seus precursores, é formar mevalonato, o composto regulatório na formação do colesterol. Ao fazer a conversão da HMG-Coa em mevalonato isto implica no seguinte resultado: quanto maior ação da HMG-CoA redutase, maior será a formação de colesterol. Ao inibir esta redutase, ocorre resposta celular que envolve aumento da síntese de proteínas receptoras do LDL-c – o up regulation – o que promove maior depuração do LDL-c para os hepatócitos. As vastatinas, têm como papel principal, inibir então, a HMG-CoA redutase, levando o hepatócito ao up regulation dos receptores LDL, objetivando então reduzir os níveis plasmáticos desta lipoproteína. Estes efeitos benéficos, são correlacionados com o colesterol baixo, sugerindo que outros mecanismos possam estar envolvidos neste na atividade antiaterosclerótica. Mevalonato é o produto resultante do metabolismo da HMG-CaA redutase é precursor não somente do colesterol, mas de compostos isoprenóides que permitem anexar proteínas sinalizadoras na membrana celular. Dentre estes mecanismos estão: alteração da disfunção endotelial, levando ao aumento da produção de óxido nítrico (NO), potente vasodilatador e gerador de radicais livres, estabilização da placa aterosclerótica, regulação da angiogênese, redução da resposta inflamatória e propriedades antitrombóticas. As evidências indicam que os iHMG-CoA redutase modulam a coagulação do sangue em múltiplos níveis, levando à significante redução da trombogênese (MALTESE 1990; CASEY 1998).

Veja a tabela dos possíveis efeitos das estatinas sobre a cascata da coagulação:



A ação vastatínica sobre o fator tissular (TF), mais especificamente da sinvastatina e fluvastatina, diminui a expressão do RNAm do TF, em concentrações séricas menores do que o pico  de concentração de pravastatina (100 vezes maior), contudo não promove inibição da expressão de RNAm do TF. Este efeito é atribuído em parte à inibição da mediação pelo NFκ-B, que é um fator ativador da transcrição nuclear(COLLI et al 1997 apud UNDAS et al. 2005). Uma casuística hipercolesterolêmica apresentou (ALESSANDRI et al. 1996; JOUKHADAR et al. 2001; MORISHITA et al. 2001) redução da geração de trombina, refletida por baixos níveis de protrombina. Além disto, com 90 dias de tratamento por atorvastatina, sinvastatina ou pravastatina, foi também desmonstrado significante diminuição dos níveis séricos de trombina no sangue periférico. Lacoste et al. (1995) demonstrou significante redução da formação de trombo mural na porção aórtica média em 16 pacientes com IAM e hipercolesterolêmicos que usaram pravastatina 40 mg/dia. Estas descobertas indicam claramente que a correção do aumento do potencial trombogênico pode ter um importante e indispensável benefício clínico no início dos eventos coronários agudos. É possível entender que as novas propriedades das estatinas são sugestivas de que esta droga pode atuar como moderado anticoagulante, e em parte, explicar os benefícios terapêuticos observados nos pacientes com variações dos níveis de colesterol, incluindo aqueles que apresentam eventos coronários agudos.
 

Figura 1. Representa os efeitos das estatinas em vários fatores dentro das vias intrínseca e extrínseca da coagulação. Em azul, estão representados os pontos onde há ação intensificadora das estatinas e em vermelho, os pontos onde há menor intensificação da ação das estatinas.

Bibliografia
 - LaROSA, JC.; HE, J.; VUPPUTURI, S. Effects of statins on risk of coronary artery disease: a meta-analysis of randomized controlled trials. JAMA, 282: 2340-2346, 1999.
 - LAW, MR.; WALD, NJ.; RIDMOCKA, AR. Quantifying effect of statins on low density lipoprotein cholesterol, ischaemic heart disease, and stroke: systemic review and meta analysis. BMJ, 326:1423, 2003.
 - MALTESE, WA.; Posttranslational modification of proteins by isoprenoids in mammalian cells. FASEB J. 4: 3319-3328, 1990.
 - CASEY, PJ. Protein lipidation in cell signaling. Science, 268: 221-225, 1995.
 - LACOSTE,L.; LAM, JYT.; HYNG, J.; LETCHACOSVSKI, G.; SOLYMOSS, CB.; WATERS, D. Hyperlipidemia and coronary disease. Correction of the increase thrombogenic potential with cholesterol reduction. Circulation, 92: 3172-3177, 1995.
 - JOUKHADAR, C.; KLEIN, N.; PRINZ, M.; SCHROLNBERGER, C.; VUKOVICH, T.; WOLZT, M.; SCHMETTERER, L.; DORNER, GT. Similar effects of atorvastatin, simvastatin and pravastatin on thrombogenic and inflammatory parameters in patients with hypercholesterolemia. Thromb. Haemost., 85: 47-51, 2001.
 - ALESSANDRI, C.; BASILI, S.; MAURELLI, M.; BRACAGLIA, D.; ANDREOZZI, P.; PERGOLI, M.; CORDOVA, C. Relationship between prothrombin activation fragment F1 + 2 and serum cholesterol. Haemostasis., 85: 213-219, 1996.
 - MORISHITA, E.; ASAKURA, H.; SAITO, M.; YAMAZAKI, M.; ONTACHI, Y.; MIZUTA, K.; KATO, M.; MATSUDA, T.; NAKAO, S. Elevated plasma levels of free-form of TFPI antigen in hypercholesterolemic patients. Atherosclerosis, 154: 203-212, 2001.
 - UNDAS, A.; BRUMMEL-ZIEDINS, KE.; MANN, KG. Statins and  blood coagulation. Arterioscler. Thromb. Vasc. Biol, 25: 287-294. 2005.
 - RANG, HP.; DALE, MM.; RITTER, JM.; FLOWER, RJ. RANG & DALE FARMACOLOGIA – Aterosclerose e metabolismo das lipoproteínas, 6ª Edição, Elsevier Editora Ltda, Rio de Janeiro-RJ, 321-330, 2007.
 - STRYER, L. Bioquímica – Biossíntese de lipídeos de membrana e esteróides, 4ª Edição, Guanabara Koogan S.A., Rio de Janeiro-RJ, 651-678, 1996.
 - REIS JR, D. Tabela dos possíveis efeitos das estatinas, 2010, com base em UNDAS et al. 2005.